segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Simples assim

Certo dia desses, vi uma cena que provavelmente já havia visto centenas de outras vezes, mas que no momento me tocou de uma maneira diferente. Havia saído para me “divertir” numa sexta-feira à noite, e desta vez resolvi ir de ônibus. Às 21:00 em ponto, chega o ônibus. Nesse horário quase mais nada funciona, apenas bares, shopping e outros meios de entretenimento, e é claro o suporte para isso, como o ônibus supracitado.

Eu estava pensando em milhares de coisas sobre como iria ser minha noite, o que me motiva a sair, o que me motiva a beber, enfim criando algumas expectativas e evitando outras. Estava voltando da lanchonete onde fui comprar mais cigarros quando desce do ônibus o trocador, um senhor que provavelmente deveria ter mais de 60 anos. A primeira coisa neste senhor que me chamou a atenção foi o seu sorriso, que me pareceu deveras espontâneo, isso também deveria ser normal, mas para mim não era. Em primeiro lugar na minha opinião ser trocador de ônibus está numa lista entre os piores empregos do mundo, aturar um ônibus balançando o dia todo, sem fazer nada, e ainda por cima com centenas de passageiros chatos puxando assunto várias vezes por dia deve ser algo realmente assustador. Além disso, pensei comigo mesmo, como alguém, trabalhando numa sexta-feira à noite, com essa idade pode estar feliz?

O senhor estava com seu uniforme, tirando um maço de cigarros do bolso e compartilhando com seus amigos. Neste momento eu pensei, o que será que ele faz nas horas vagas? O que motiva este senhor a continuar?

Inevitavelmente veio a minha mente uma comparação das coisas que eu faço e julgo importante e as coisas que ele faz. Para mim é importante criar, estou o tempo todo pensando em tocar, compor, escrever poemas, textos, artesanato, enfim, qualquer processo criativo me agrada. Já este senhor, duvido que ele faça alguma destas coisas. Além do mais sua vida sexual era obviamente rotineira, se é que havia alguma vida sexual para ele. A julgar pelo o seu visual, ele não devia ser muito preocupado em conquistar outras mulheres, acho que esta é uma preocupação que não lhe concerne.

A julgar por seus assuntos, ele não parece um apreciador de cinema, música, literatura, fotografia ou qualquer tipo de arte cult. Então o que diabos este homem faz em seu tempo vago? Eu tenho milhões de coisas para fazer no meu tempo vago e continuo buscando mais coisas, como alguém pode viver numa vida tão diferente da minha?

Isso me faz pensar nas várias outras pessoas que passaram em minha vida que levam uma vida assim, com uns objetivos fixos, palpáveis e simples. Trabalhar, ganhar dinheiro, gastar dinheiro com bens de consumo e pronto, receita de bolo infalível.

Será que a vida pode ser tão simples, será que sou tão frívolo que não vejo o sentido real das coisas? Até esse dia pensava inocentemente que todos eram como eu, que todos teorizavam sobre a vida, que todos apertavam seus pulsos, tentando evitar que o tempo que escoa entre os seus dedos se esgote. Mas não, algumas pessoas só fazem, simplesmente fazem, ou simplesmente deixam de fazer. Simples assim.

Mas pensando nesta simplicidade toda eu me sinto como se tivesse visto um filme sem o final, algo inacabado. Será que tem algum motivo bobo e simples para ser feliz e sentir motivação para viver? Se existe por favor me conte, porque eu tento achar todos os dias e até hoje só acho perguntas. Talvez o trocador tenha a resposta, ou talvez ele nunca tenha se feito esta pergunta.

Talvez seja melhor mesmo não teorizar, só fazer. Talvez a vida seja um destes atos impulsivos que experimentamos. Um destes bem mundanos, motivados por tesão, álcool, medo ou orgulho. Algo que quem não teoriza consegue tirar de letra, algo que “teorizadores” como eu, talvez nunca sintam o gosto. Algo simples como viver.